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O Mundo está voltando à Idade Média?

    Em meados desse mês de novembro/2019 a China anunciou que foram diagnosticados dois casos de peste pneumônica em indivíduos procedentes da Mongólia Interior - região independente que fica ao norte do país.

     Os dois indivíduos procuraram atendimento médico no Distrito de Chaoyang, a leste de Pequim.

        O anuncio confirmando os casos foi feito pela Organização Mundial da Saúde [OMS] no dia 13/11.

     Os indivíduos foram colocados em quarentena após terem sido diagnosticados com essa terrível doença infecciosa, que tem considerável letalidade - em torno de 30 a 60%, podendo chegar a 100%, se o tratamento antibiótico não for instituído dentro das primeiras 24 horas após o contágio.

     As autoridades de saúde chinesas disseram que todas as pessoas em risco de exposição à doença foram localizadas e tratadas, e que os hospitais intensificaram o monitoramento de pessoas com sintomas semelhantes. Segundo a OMS, as autoridades chinesas intensificaram a vigilância epidemiológica da doença.

        Eles acrescentaram ainda que o risco de um surto de peste pulmonar no país é mínimo.

    Os surtos na China não são frequentes, mas grande parte da cidade de Yumen, no Noroeste, foi colocada em quarentena em 2014, depois que um morador de 38 anos morreu de peste bubônica.

   As populações de roedores aumentaram na Mongólia Interior após secas persistentes, agravadas pelas mudanças climáticas. Uma área do tamanho da Holanda foi atingida por uma explosão de ratos no verão passado, causando danos de 600 milhões de yuans, informou a agência de notícias oficial Xinhua.

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 Em Madagascar, um surto de peste em 2017 deixou mais de 200 mortos.

Mas... o que é a Peste?

    A peste é uma zoonose focal, primordialmente uma doença de roedores, causada pela bactéria Yersinia pestis, transmitida de um animal a outro através da picada de pulgas infectadas. O homem é infectado acidentalmente quando, em atividades de caça, agricultura, comércio ou lazer, penetra no ecossistema dos roedores reservatórios da infecção. Em condições especiais, a peste pode ser transmitida de homem a homem.

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Yersinia pestis

Bacilo Gram negativo da família Enterobacteriaceae

     Os seres humanos podem ser infectados através: da picada do vetor infectado, contato desprotegido com fluidos corporais infecciosos ou materiais contaminados, pela inalação de gotículas respiratórias/pequenas partículas de um paciente com peste pneumônica.

 

   A peste é uma doença muito grave nas pessoas, particularmente nas formas septicêmica e pneumônica, com uma taxa de letalidade de 30% a 100% se não tratada. A forma pneumônica é invariavelmente fatal, a menos que seja tratada precocemente. É especialmente contagiosa e pode desencadear epidemias graves através do contato pessoa a pessoa através de gotículas no ar.

Vias de Transmissão

    As vias de transmissão da peste estão esquematizadas na figura abaixo. A picada de pulgas é o principal mecanismo de transmissão da doença.

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Fonte: Coura, JR. Peste. In: Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias. 2005.

A bactéria da peste pode ser transmitida aos seres humanos das seguintes maneiras:

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Pulga Xenopsylla cheopis

Principal vetor-reservatório da bactéria Yersinia pestis

1. Picada de Pulga: 

 

As bactérias da peste são mais frequentemente transmitidas pela picada de uma pulga infectada. Durante a epizootia da peste, muitos roedores morrem, fazendo com que as pulgas com fome busquem outras fontes de sangue. Pessoas e animais que visitam lugares onde roedores morreram recentemente de peste correm o risco de serem infectados por picadas de pulgas. Cães e gatos também podem trazer pulgas infectadas pela peste para dentro de casa. A exposição à picada de pulga pode resultar em peste bubônica primária ou peste septicêmica.

2. Contato com Fluído ou Tecido Contaminado: 

 

Os seres humanos podem ser infectados ao manusear tecidos ou fluidos corporais de um animal infectado pela peste. Por exemplo, um caçador que esfolia um coelho ou outro animal infectado sem usar as precauções adequadas pode ser infectado por bactérias da peste. Essa forma de exposição geralmente resulta em peste bubônica ou septicêmica.

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Roedores - principais carreadores de pulgas infectadas pela bactéria Yersinia pestis

3. Gotículas Infecciosas [droplets]: 

 

Quando uma pessoa tem pneumonia por peste, ela pode tossir no ar gotículas contendo a bactéria da peste. Se essas gotículas contendo bactérias forem inspiradas por outra pessoa, elas podem causar peste pneumônica. Normalmente, isso requer contato direto e próximo com a pessoa com peste pneumônica. A transmissão dessas gotículas é a única maneira de a praga se espalhar entre as pessoas. Esse tipo de disseminação não é documentada nos Estados Unidos desde 1924, mas ainda ocorre com alguma frequência nos países em desenvolvimento. Os gatos são particularmente suscetíveis à peste e podem ser infectados pela ingestão de roedores infectados. Gatos doentes representam um risco de transmitir gotículas de peste infecciosa aos seus donos ou veterinários. Vários casos de peste humana ocorreram nos Estados Unidos nas últimas décadas, como resultado do contato com gatos infectados.

Sinais & Sintomas

     Os sintomas da peste dependem de como o paciente foi exposto à bactéria. A peste pode assumir diferentes formas clínicas, mas as mais comuns são bubônicas, pneumônicas e septicêmicas.

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Peste Bubônica:

    Os pacientes desenvolvem febre repentina, dor de cabeça, calafrios e fraqueza e um ou mais gânglios linfáticos inchados e doloridos (chamados de bubões, os quais, no fluído, contem considerável quantidade da bactéria Y. pestis). Esta forma geralmente resulta da picada de uma pulga infectada. As bactérias se multiplicam no linfonodo mais próximo de onde as bactérias entraram no corpo humano. Se o paciente não for tratado com os antibióticos apropriados, a bactéria pode se espalhar para outras partes do corpo. Período de incubação da doença - de 2 a 6 dias.

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Peste Septicêmica:

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    Os pacientes desenvolvem febre, calafrios, fraqueza extrema, dor abdominal, choque e possivelmente sangramento na pele e em outros órgãos. A pele e outros tecidos podem ficar pretos e necrosam, principalmente nos dedos das mãos e dos pés e no nariz. A peste septicêmica pode ocorrer como o primeiro sintoma da peste, ou pode se desenvolver a partir da peste bubônica não tratada. Essa forma resulta de picadas de pulgas infectadas ou do manuseio de um animal infectado. Período de incubação da doença - de 2 a 6 dias.

Peste Pneumônica:

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   Os pacientes desenvolvem febre, dor de cabeça, fraqueza e uma pneumonia em rápido desenvolvimento com falta de ar, dor no peito, tosse e, às vezes, mucosas com sangue ou lacrimejamento. A peste pneumônica pode se desenvolver a partir da inalação de gotículas infecciosas ou a peste bubônica ou septicêmica não tratada após a disseminação da bactéria para os pulmões. A pneumonia pode causar insuficiência respiratória e choque. A peste pneumônica é a forma mais grave da doença e é a única forma de peste que pode se espalhar de pessoa para pessoa (por gotículas infecciosas - droplets). Período de incubação da doença é mais curto nessa forma - de 1 a 3 dias.

Diagnóstico & Tratamento

     A peste é um diagnóstico plausível para pessoas que estão doentes e vivem ou viajaram recentemente para áreas endêmicas da doença. O sinal mais comum de peste bubônica é o rápido desenvolvimento de uma glândula linfática inchada e dolorosa chamada bubo. Uma picada de pulga conhecida ou a presença de um bubão pode ajudar o médico a considerar a praga como causa da doença.

 

    Em muitos casos, particularmente na peste septicêmica e pneumônica, não há sinais óbvios que indiquem peste. O diagnóstico é feito colhendo amostras do paciente, especialmente sangue ou parte de uma glândula linfática inchada, e submetendo-as a testes de laboratório. Depois que a praga for identificada como uma possível causa da doença, o tratamento apropriado deve começar imediatamente.

 

      A peste é uma doença muito grave, mas é tratável com antibióticos comumente disponíveis. Quanto mais cedo o paciente procurar atendimento médico e receber tratamento adequado para a peste, maiores serão as chances de recuperação completa.

     A estreptomicina é o antibiótico padrão-ouro para o tratamento da peste. A gentamicina também tem boa resposta, sendo a segunda escolha.

   Pessoas em contato próximo com pacientes com peste pneumônica muito doentes podem ser avaliadas e possivelmente colocadas sob observação. A antibioticoterapia preventiva também pode ser administrada, dependendo do tipo e do momento do contato pessoal.

Medidas de Prevenção

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Reduza o habitat de roedores em sua casa, local de trabalho e áreas de lazer. Remova pincel, pilhas de pedras, lixo, lenha desordenada e possíveis suprimentos de roedores, como alimentos para animais de estimação e animais selvagens. Faça a sua casa e dependências à prova de roedores.

Use luvas se estiver manuseando ou esfolando animais potencialmente infectados para impedir o contato entre a pele e as bactérias da peste. Entre em contato com o departamento de saúde local se tiver dúvidas sobre o descarte de animais mortos.

Use repelente se achar que pode ser exposto a pulgas de roedores durante atividades como acampar, fazer caminhadas ou trabalhar ao ar livre. Os produtos que contêm DEET [repelente a base de dietiltoluamida] podem ser aplicados à pele, assim como roupas e produtos que contêm permetrina podem ser aplicados à roupa (siga sempre as instruções no rótulo).

Mantenha pulgas fora de seus animais de estimação, aplicando produtos de controle de pulgas. Os animais que vagam livremente têm maior probabilidade de entrar em contato com animais ou pulgas infectados pela peste e podem levá-los para casa. Se o seu animal de estimação ficar doente, procure atendimento veterinário o mais rápido possível.

Não permita que cães ou gatos que circulam livremente em áreas endêmicas durmam em sua cama.

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Atenção!

Paciente internado com peste pneumônica requer precaução aérea por 48 horas de uso de antibiótico.

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Respirador N95/PFF2 deve ser usado pelos profissionais ao entrarem no quarto.

Quarto deve ser privativo obrigatoriamente.

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Higienize as mãos!

Fontes:

Acesse clicando nas imagens

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Almeida, A; Tavares, C & Leal-Balbino, TC. Peste.

In: Coura, JR. Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias.
Editora Guanabara Koogan, 2º Vol, Cap 126, Pags: 1509-21. RJ, 2005.

A Peste no Brasil...

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     O primeiro caso da doença no Brasil foi notificado no porto de Santos em 1899, comprovado bacteriologicamente por Vital Brasil e Osvaldo Cruz. Daí por diante, a doença se espalhou para várias cidades do litoral brasileiro na seguinte ordem: 1900, nos portos do Rio de Janeiro e Fortaleza; 1902 nos de Pernambuco e Rio Grande do Sul; 1903 nos do Pará e Maranhão; 1904 no da Bahia; 1906, nos do Paraná, Espírito Santo e Sergipe; 1912, no da Paraíba e em 1914 no de Alagoas. Atualmente a peste se encontra distribuída no Brasil em dois grandes focos naturais. O foco do nordeste corresponde a partes dos Estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte. O foco do Sudeste corresponde a partes dos Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro [imagem abaixo].

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      A maior ocorrência de casos de peste aconteceu antes da década de 70. A partir de então a morbidade e mortalidade da doença apresentou declínio no Brasil. Foram registrados surtos isolados no Planalto Oriental da Bahia (1974); na Chapada do Araripe no Ceará e Pernambuco (1975); e na Chapada da Borborema na Paraíba (1986). Já na última década do século passado os casos foram notificados de forma esporádica. O estado do Ceará notificou e confirmou três casos em 1994, 1996 e 1997. Desde então, o único e último caso confirmado de peste no Brasil ocorreu no mesmo estado no município de Pedra Branca no ano de 2005.

Fonte:

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Pereira, SVC. Avaliação do Sistema de Vigilância Epidemiológica da Peste no Brasil, 2000-2009.
Dissertação Mestrado Profissional. Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia. ENSP/FIOCRUZ. RJ, 2012.

Breve  História da Peste e a Humanidade...

    A peste é uma das doenças mais antigas conhecidas pela humanidade, constando registros já no Antigo Testamento.

    Originária provavelmente do Planalto Central Asiático, foi responsável por grande morbimortalidade em diferentes épocas.

    Durante a era Cristã, é possível caracterizar três grandes pandemias na sequência denominadas:

1ª) Peste de Justiniano [542-602 d.C.]

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     Iniciou-se no Egito e se disseminou por todo mundo civilizado, atingindo Ásia, África e Europa, com alta letalidade.

     A peste recebeu esse nome porque ocorreu durante o reinado de Justiniano I - Imperador bizantino [527-565]. É estimado que em torno de 100 milhões de pessoas tenham morrido em decorrência da peste de Justiniano.

2ª) Peste Negra [Séculos XIV ao XVI]

      Iniciou-se na Ásia e estendeu-se por toda Europa e Norte da África. A sua principal expressão clínica foi a forma pneumônica, gravíssima, dizimando mais de 25 milhões de pessoas na Europa entre 1347-1353.

3ª) Pandemia Contemporânea ou Terceira Pandemia [1855]

      Originou-se provavelmente na Mongólia, estendendo-se para Hong Kong, em 1894, e de lá se espalhou pra os Estados Unidos, América do Sul, África do Sul e Madagascar através de transporte marítino.

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Alexander Yersin

1894 - isolou o agente etiológico da peste [a bactéria]

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Paul-Louis Simond

1898 - descobriu o papel da pulga na transmissão

Por que a Peste Negra foi tão devastadora na segunda pandemia [Idade Média]?

     A pior pandemia que se tem história na humanidade, se deu de forma tão devastadora durante séculos seguidos devido ao contexto social, econômico e científico da época. Eis alguns pontos relevantes...

 

    A vida medieval criava uma série de condições para a propagação da peste bubônica, ou seja, para uma superpopulação de ratos e para a transmissão de pessoa a pessoa. Os transeuntes das cidades medievais passavam por ruas e becos estreitos com pouca iluminação, muitas vezes lamacentos por causa das chuvas. Não era raro que das janelas se jogassem excrementos nesses becos. As pessoas não se apercebiam da quantidade de ratos ali existentes em tempos quentes. Poucas localidades contavam com ruas pavimentadas. Os habitantes das cidades muradas tinham hábito a criação de animais, como porcos, por exemplo. Um comércio comum era o que se fazia nos matadouros, alguns dos quais construídos de maneira que os miúdos e as carcaças pudessem ser lançados nos riachos ou córregos, muito comuns e repletos de ratos.

     A privacidade não era importante para a população da Idade Média. As pessoas dormiam num mesmo quarto. As famílias de posse tinham uma cama larga na qual dormiam várias pessoas; os pobres podiam não ter cama, mas também dormiam juntos num mesmo recinto. Nessas casas, eram colocadas de tempos em tempos tinas de água para banho. As famílias travavam uma luta constante contra pulgas, que dificilmente eram derrotadas. Quando um de seus membros adoecia, era tratado pelos demais. Entretanto, como todos habitavam um mesmo quarto, se essa pessoa tivesse a forma pulmonar da peste, poderia propagá-la ao tossir e expelir a bactéria. Caso fosse picada pelas pulgas, estas se infectariam e, por sua vez, transmitiriam a doença para os demais membros da família. Os muros da cidade limitavam a acomodação da população, cada vez maior, o que aumentava a aglomeração humana.

     Assim, o rato foi um instrumento fundamental para a disseminação da peste bubônica no Século XIV, fornecendo a bactéria em suas pulgas.

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Referências bibliográficas utilizadas:

Coura, JR. Peste. In: Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias.
Editora Guanabara Koogan, 2º Vol, Cap 126, Pags: 1509-21. RJ, 2005.

Ujvari, SC. A Peste Bubônica. In: A História e Suas Epidemias - A Convivência dos Homens com os Microrganismos.
Editora SENAC RJ, Pags: 54-71. SP, 2003.

Quer saber mais sobre a Peste e a Humanidade? Veja o vídeo abaixo!

Fonte:  National Geographic [tem legenda em Português]

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